“Não existe água sem floresta, não existe floresta sem água e não existe sociedade sem água e sem floresta”.
Hoje vou falar de um programa que tive oportunidade de conhecer in loco na última quinta-feira, quando, convidada pelo Instituto Coca-Cola, fui a uma base de trabalho da Fundação SOS Mata Atlântica em Itu ver como funciona o Água das Florestas. O assunto será divido em dois e neste post procurarei explicar o que é o programa, o seu contexto na região, porque ele é tão estratégico para a Coca-Cola e também o porquê dele quebrar, em minha opinião, o maior paradigma da sustentabilidade corporativa.
No post seguinte abordarei o que foi a minha quinta-feira. Falarei da visita à cidade de Itu, a experiência do programa na Fazenda Capoava, o jequitibá lindo que eu vi, a aula de meio ambiente que tive com pessoas que te contagiam com o brilho nos olhos de tanta paixão pelo que fazem, as ameaças ambientais que vira e mexe rondam a região... enfim, o mesmo assunto com outra perspectiva.
Antes de falar do programa em si, é importante situar para quem é leigo porque floresta e água não andam separadas. Assim como para todos os seres vivos, a água é fonte de vida para a vegetação das florestas. E estas, em contrapartida, protegem e preservam os mananciais. Caso as florestas sejam desmatadas, o solo entrará em processo de erosão, assoreando rios, provocando enchentes e reduzindo a atividade destes mananciais, fazendo com que haja menos água potável.
Pois bem, o Água das Florestas é um programa do Instituto Coca-Cola em parceria com a SOS Mata Atlântica cujo objetivo é recuperar, proteger e manter mananciais de água através da recomposição florestal de margens de rios e lagos. O programa vem ajudar a preencher uma lacuna da empresa no que é o calcanhar de Aquiles de todas as fabricantes de bebidas: a água. Ele é realizado no estado de São Paulo, onde fica não apenas a fábrica da Coca, mas de muitas de suas concorrentes.
A região onde se encontra a maioria das fábricas de bebidas em São Paulo é tensa por causa da demanda de água da capital e das cidades no entorno. Para se ter ideia do nível do problema, a capacidade de abastecimento da região está perto do limite, mesmo ela “importando” água dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, que iria, naturalmente, para o interior do estado. Por conta disso, a ONU prevê que em breve a tensão em relação à água ali será pior que no nordeste do país, gerando graves conflitos.
Falando mais especificamente do Água das Florestas, o programa, que é executado pela SOS Mata Atlântica com alguns parceiros operacionais, contempla em sua fase inicial toda a Bacia do Piraí, que possui 46km de extensão, nascendo na Serra do Japi, na cidade de Cabreúva, e cortando os municípios de Indaiatuba, Salto e Itu. Durante esta etapa, o programa, que tem investimento de 27 milhões de reais, estima o reflorestamento de cerca de 3,3 milhões de espécies nativas em uma área de três mil hectares (equivalente a três mil campos de futebol).
A dinâmica adotada pelo programa faz dele algo bastante complexo e interessante. Mais do que simplesmente fornecer ou plantar as mudas, o Água das Florestas optou por conscientizar e convencer proprietários e população local sobre a importância do reflorestamento e da transformação de suas terras em APP (Área de Preservação Permanente). Esse caminho muitas vezes se mostra tortuoso e frustrante.
Mas mesmo que a postura adotada torne a implementação do programa mais lenta e mais difícil, esse é o verdadeiro caminho para o desenvolvimento sustentável, que só se dá com a mudança de postura de pessoas. Afinal, que valor real teria para o meio ambiente se a Coca-Cola comprasse as terras e o proprietários, com o dinheiro da venda, comprassem outras e continuassem desmatando?
E para destacar ainda mais a importância do programa, vale mencionar que há contrapartida para os proprietários. Uma vez aceito o compromisso da parceria entre as partes, a execução do Água das Florestas na propriedade gera renda, já que ele foi desenvolvido para ser elegível ao mercado de carbono convencionado através do Protocolo de Kyoto. Isso sem contar que ele também gera emprego para a população local.
Finalizando o primeiro post sobre o assunto, o que mais me encantou nesse programa, e que, em minha opinião, foi capaz de derrubar a maior barreira da sustentabilidade corporativa, é o tempo de compromisso. Todos os proprietários que aceitam fazer parte do Água das Florestas assumem um compromisso de preservação da área por 30 anos. Sabem o que isso significa?
Que pelo lado do meio ambiente, novos proprietários ou as novas gerações da mesma família terão de levar adiante a bandeira de preservação e da mudança para uma postura orientada para o desenvolvimento sustentável. E que pelo lado estratégico, alguém dentro de uma grande empresa percebeu que os resultados de sustentabilidade não são alcançados de um dia para o outro; que será preciso a passagem de muitos presidentes e diretores para que se colham, efetivamente, os louros por se fazer o que é certo, da maneira certa.