segunda-feira, 13 de maio de 2019

O dever da imprensa com a sustentabilidade

Talvez você não saiba, mas apesar de nunca ter exercido a profissão, eu sou formada em jornalismo. Não vem ao caso o porquê de eu ter optado por nunca praticar o ofício e ter enveredado por um lado completamente oposto, o da quase exatas. O mestrado de engenharia está aí para mostrar que eu pertenço mesmo ao outro lado da força.

De qualquer forma, expus essa informação apenas para dizer que, mesmo sem prática, tenho relativa propriedade para falar sobre jornalismo. E a verdade é que eu acho que ele, o jornalismo, pelo menos o brasileiro, faz um baita de um desserviço para a sustentabilidade. Sorry quem se ofendeu, mas cabe a você e não a mim virar esse jogo. Corre que ainda dá tempo.

Ao contrário do que algumas pessoas acham, não acredito que a saída seja criar uma editoria temática nas redações. Em alguns jornais, canais, portais, emissoras de rádio ela até existe. Alguns jornalistas até são especializados em meio ambiente, mas, sinceramente, a questão não é essa. O problema é falta de entendimento do conceito, de como ele funciona e a visão multidimensional necessária para falar de sustentabilidade. Digamos que o jornalismo seja 2d e sustentabilidade 3d.

Do pouco espaço que a pauta tem na imprensa, quase sempre a informação é dada por alguém sem o menor conhecimento do que seja sustentabilidade. Lembro da vergonha alheia que foi a entrevista com o ministro do meio ambiente na GloboNews na época da tragédia de Brumadinho. Um bando de jornalistas de politica sem o menor preparo para fazer pergunta pro cara.

Nessa mesma época da tragédia, durante a extensa cobertura, não teve uma viva alma, UMA VIVA ALMA, para questionar a natureza da atividade de mineração. Todo mundo focou apenas no óbvio, que foi a falha de segurança da Vale e o uso de uma técnica ultrapassada na construção de barragens. Ninguém ousou questionar para onde vai o minério, como ele impacta o meio ambiente, qual o seu papel no consumo desenfreado, o que é feito dele depois do descarte...

Ain, Julianna, e o Trigueiro?

Cara, eu acho o Trigueiro um puta jornalista, um papo excelente, tem muito conhecimento de meio ambiente, mas falta a ele o que falta a todo e qualquer jornalista quando vai falar de assuntos complexos: descer do pedestal e ligar o modo Ana Maria Braga de ser. Independente de você gostar ou não do programa dela, na minha opinião de comunicóloga não praticante, a sua maior virtude é ter a capacidade de falar com qualquer tipo de público. Desde a classe Z até a dondoca sustentada pelo marido que às nove da manhã já voltou da academia e está começando o seu dia.

Dos pouquíssimos jornalistas com conhecimento para escrever sobre assuntos relacionados à sustentabilidade, André Trigueiro incluído, o que eu vejo são eles falando para suas plateias. Que são a minoria da minoria da minoria da população. Acontece que os fundamentos da sustentabilidade não devem ficar restrito a um rincão elitista. É o que eu sempre digo: somos quase oito bilhões de pessoas gerando impactos ambientais a todos os momentos. É muita pressão pra um planetinha só.

E o que acontece é que a maioria das pessoas não tem o menor conhecimento disso e qual deve ser o seu papel enquanto cidadão responsável. O jornalismo de massa tem de ensinar isso. Mas ao contrário, já vi várias oportunidades perdidas em pautas de grande interesse em que a falta de familiaridade do jornalista com o assunto e a tal da visão 3d mata a sustentabilidade.

Por exemplo: nos momentos áureos da nossa economia, vira e mexe o então governo fazia uma coletiva de imprensa para anunciar a redução dos impostos para carro. Não tinha uma viva alma questionando o impacto do aumento da circulação de automóveis na cidade, tanto pela questão de trânsito, de tempo perdido, de qualidade de vida, de saúde, de meio ambiente.

Outro exemplo foi a proibição dos canudos de plástico. Todo mundo, TODO MUNDO, fez uma matéria sobre os materiais substitutos. Nenhum, absolutamente nenhum jornalista se dispôs a questionar a necessidade de se usar canudos. Nem o André Trigueiro (que eu saiba), que se focou apenas em alertar para o perigo ambiental de usar canudo de plástico oxi-biodegradável. Você sabe o que é isso? Pois é, foi ele, novamente, falando para a sua plateia e não para um público médio.

A questão é que o jornalismo deveria ter um importante papel social, ou melhor, dever social com a sustentabilidade. Porque é o que eu sempre digo: ninguém precisa ter a sustentabilidade como causa, mas todo mundo tem a sua cota de responsabilidade com ela.  Afinal, repetindo, somos quase oito bilhões de pessoas gerando impacto todo dia.

Portanto eu pergunto para quem exerce a profissão: onde estão as pautas de engajamento para o consumo responsável, onde estão as pautas positivas, do tipo ficar sem comer carne um dia na semana reduz X de emissões de gases do efeito estufa e X de consumo de água? Porque ao contrário do que muito jornalista noticia, ninguém vai simplesmente virar vegano por causa de peido de vaca. Então, entre criar a ilusão de que bilhões de pessoas vão se alimentar de luz porque o planeta está ficando quentinho e usar a mídia para realmente provocar uma mudança, o que você como profissional de comunicação de massa está fazendo?


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