quarta-feira, 21 de julho de 2010

Analisando os relatórios de sustentabilidade – O relatório 2009 da BP

Quando escrevi sobre a tragédia da BP, tive um olhar bem diferente da maioria dos blogs que trataram do assunto. Menos focada no que aconteceu e com olhar mais voltado para a estratégia da empresa, fiz uma análise sobre a comunicação, o marketing e o reporte de sustentabilidade da empresa que, anos atrás teve seu relatório considerado o melhor do mundo e modelo a ser seguido. Acho que gostaram tanto da abordagem, que inclusive, quase dois meses depois, o blog Razão Social, do Jornal O Globo, teve uma pauta praticamente idêntica.

Mas enfim, o assunto agora é outro. Assim como desde o início do ano venho eventualmente escrevendo sobre cases de sustentabilidade corporativa, a partir de agora também passarei a escrever uma análise sobre o relatório de sustentabilidade das empresas. E a BP é, justamente, a “cobaia” dessa nova série que está começando no blog. Meu objetivo com isso é, principalmente, desmistificar armadilhas da comunicação que fazem com que, através de relatórios, as empresas pareçam as organizações mais perfeitas do planeta.

Pois bem, não vou mentir. Os responsáveis pelo relatório de sustentabilidade da BP são bons. Do início ao fim fazem a gente pensar que a BP é uma empresa progressista, que olha para o futuro e que esse futuro se dará com energia de baixo carbono. Mas como um olhar mais criterioso não acredita em conto de fadas, alguns pontos no relatório são bem nebulosos.

Exemplos: em dois anos a BP cortou quase 18 mil postos de trabalho, não explicou o corte no relatório e, ao mesmo tempo, ampliou (e muito) seus negócios. Terceirização? Precarização do trabalho? Nesse meio tempo, a contribuição para as comunidades caíram consideravelmente, de U$ 135,8 milhões em 2007 para U$106,8 milhões em 2009. Será que está ficando pobre? Afinal, o desastre de abril aconteceu por conta de uma economia de “míseros” U$ 10 milhões!

Uma informação conflitante presente no relatório de uma empresa que se diz em busca da energia de baixo carbono é o investimento em oil sand. Algo como exploração em areias petrolíferas. Esse tipo de extração chega a emitir até três vezes mais carbono que a extração de petróleo comum e demanda muita água.

Um grande problema do relatório da BP é que ele não aponta deficiências. Ok, 99% das empresas que fazem reporte também não comunicam isso. Acontece que ao falar de seus problemas, a BP cria uma falsa impressão e ilude as pessoas a acreditarem que é uma empresa transparente. Acontece que a forma como ela trata desses problemas é sempre minimizada e, transformada em algo positivo.

Apesar de problemas de comunicação tendenciosa comum aos relatórios da maioria das companhias, apenas uma simples informação que, obviamente, não consta no relatório da BP, poria por terra toda essa imagem progressista. Por mais que queira fazer com que acreditemos que ela seja Beyond Petroleum, por mais que seu relatório de sustentabilidade seja quase todo baseado nesse aspecto, 93% do seu investimento é direcionado à exploração de petróleo e gás. Duas das fontes energéticas mais sujas que existe. E aí, greenwashing?

7 comentários:

Julianna Antunes disse...

O post Analisando os relatórios de sustentabilidade – O relatório 2009 da BP foi escrito e publicado no dia 21/07/10

Rodrigo Müller disse...

Texto muito bem colocado, pois na maioria das vezes a comunicação de marketing, ou estratégia de marketing, utilizada pelas empresas tende a mostrar uma imagem organizacional diferente da realidade das organizações.

E parabéns pelo Blog.

Assunto atual e de fundamental importância para a sociedade.

Att,

Rodrigo Müller

Unknown disse...

O problema do Greenwashing nas grandes corporações, evidenciado pelo tal relatório/auto-promoção da BP, é que as consequências são proporcionais ao tamanho dessas entidades.
Bom, agora que tudo parece se encaminhar para um fim e já se pode fazer a conta do prejuízo, fica a deixa para um exame de consciência:
Tio Obama propalou em dúzias de declarações que a BP teria que se responsabilizar pelo ocorrido. Mas, o quanto da culpa nos cabe toda a vez que decidimos ir à padaria de carro?

Unknown disse...

Trabalho como editora de relatórios de sustentabilidade na Report Comunicação, de São Paulo, e posso dizer que a tentativa de produzir documentos equilibrados é um exercício diário e constante.

Acredito ser função de repórteres e editores mostrar para as empresas o quão fundamental é a prática da transparência. Eu mesma, por exemplo, já tive de "brigar" para evitar que um cliente trocasse o relato de "uma morte" por "um acidente grave" em um relatório. Nessas horas, temos de usar todos os argumentos que estiverem a nosso alcance para fazer prevalecer a verdade (que, no caso de uma morte, não é relativa).
E auditorias externas também ajudam no nosso trabalho.

Bom post, Julianna!

Julianna Antunes disse...

Adriano, o buraco do problema da BP é muito pior do que o greenwashing praticado por ela em seus relatórios de sustentabilidade anuais. É caso de polícia mesmo. Mas sim, tio Obama ou tio Bush, não sei quando essa perfuração foi autorizada, tem culpa porque o projeto entregue continha erros bizarros. Mas enfim, agora é tarde, Inês é morta, e que além da BP pagar a conta, tudo isso sirva de lição sobre o que não fazer.

Julianna Antunes disse...

Rodrigo, no dia em que aparecer uma empresa dizendo que os erros que ela cometeu foram por falta de competência ou para economizar dinheiro, vou até estranhar.

Julianna Antunes disse...

Cláudia, para quem é profissional de comunicação é fácil perceber essas discrepâncias ou quando a empresa está praticando eufemismo. O problema é que a maioria das pessoas não se atenta a isso e acaba comprando a empresa por aquilo que ela não é. O GRI até audita esses relatórios, mas engraçado, não passa confiança nenhuma. As empresas que, vira e mexe, são acusadas de greenwashing são as que têm relatórios premiados no GRI Awards. Estranho, não? De qualquer forma, a auditoria externa é um caminho interessante e um novo mercado a ser explorado. Basta convencer as empresas do quanto isso é importante.