segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

A diversidade que ninguém vê e ninguém quer nas empresas


Hoje está super na moda as empresas falarem de diversidade. Diversidade não só da porta para fora, com produtos voltados para vários tipos de minorias e maior representatividade em campanhas publicitárias, como também diversidade da porta para dentro. Está tão na moda a da porta para dentro, que qualquer empresa grande criou uma área de diversidade para chamar de sua. Oi?

É sério mesmo que precisa ter um/a gerente, um/a analista e um/a estagiário/a de diversidade? Não seria papel da área de recrutamento e seleção identificar as pessoas com perfil diverso sem as barreiras que todo mundo está careca de saber? Não seria papel da área de desenvolvimento organizacional criar uma cultura corporativa orientada para a diversidade? E, mais ainda, trabalhar o engajamento e a gestão da mudança necessária, principalmente a mente dos gestores para não colocar muros e amarras na hora da contratação?

Além de modinha, essa diversidade que todo o mundo corporativo abraçou agora é a diversidade visível e fácil de ser identificada. Quantas mulheres tem na força de trabalho da minha empresa? Quantos negros? Quantos deficientes? Pergunta lá no Posto Ipiranga, ué! Quer dizer, é só puxar o relatório no software de gerenciamento de pessoas.

Mas mais do que puxar relatório, você vê essas pessoas circulando nos corredores das empresas. E isso é altamente estratégico para as empresas porque elas não somente se beneficiam da cultura da diversidade, como elas fazem (E MUITO) marketing em cima disso. Quer dizer, tem empresa que faz mais marketing do que diversidade, mas isso é papo para outro post.

Apesar de eu não achar errado querer capitalizar em cima de boas ações corporativos, sei lá, parece que ao fazer isso a empresa está expondo carne seca no varal. Tipo, não está fazendo mais do que a obrigação, sabe? E mais do que cor, aquelas pessoas estão ali (acredito eu) por mérito. A única diferença é que os filtros utilizados foram outros.

Mesmo achando a diversidade que só agora as empresas parecem ter descoberto algo deveras importante, diria que ela já está mais do que ultrapassada. Sim, atirem pedras, mas diversidade de cor, gênero, orientação sexual, deficiência e afins é algo que a gente já deveria ter trabalhado (e superado) há muito tempo. Tipo, pelo menos uma década atrás. E digo isso porque o mundo muda tão freneticamente, que hoje a gente tem uma nova demanda por diversidade e essa é muito mais complexa de lidar.

Tenho uma visão bem curiosa e, digamos, engraçada sobre a diversidade do futuro. Para mim, a diversidade do século XXI vão ser as grandes empresas do século XX contratando gente maluca. Digo empresas do século passado porque as de agora foram fundadas por malucos e eles são a maioria nos demais cargos.

E o que eu quero dizer com gente maluca?

Gente que tem uma lógica diferente de pensar; que não está nem aí para paradigmas, para regras cristalizadas, para burocracias corporativas, para o top-down. Gente que, realmente, pensa fora da caixa. Mas mais do que isso: é gente que enxerga um palmo à frente, que vai além do óbvio e questiona o status-quo do business as usual. É gente que vê o futuro e sabe que ele é completamente diferente do que vem sendo feito hoje. E sabe também que tem de colocar a mão na massa urgente para que as empresas de ontem não sejam engolidas pelas empresas de amanhã, nativamente malucas.

Se a gente parar para pesar, as empresas deveriam disputar a tapa os malucos, não é mesmo? Na verdade, elas precisam miseravelmente de gente com esse perfil, justamente para se manter perene nas próximas décadas.

Peraí, Julianna, se tem maluco dando sopa por aí e as empresas precisam deles, o mundo é perfeito, não? Qual a pegadinha que eu ainda não entendi?

Pois bem, precisar não significa querer. Quer dizer, o problema não é nem querer. As empresas querem. O problema é o que as empresas fazem com essas pessoas quando elas são contratadas. Imagina o desconforto de funcionários padrão (não encarem isso como algo ruim) vendo o modelo de gestão que eles conhecem e dá muito lucro sendo desconstruído por quem mesmo? Pelos malucos.

O que você, que sempre ganhou prêmios e promoções por sua eficiência, sua eficácia, seus resultados, faria ao ter o seu trabalho questionado por um grupinho que chegou para fazer tudo diferente? Por gente que viaja na maionese e transforma informações abstratas em ações concretas, gente que não tem medo do novo e que adora tentar novas ferramentas, novas abordagens, novas formas de fazer aquilo que ninguém faz?

Não precisa responder não, eu respondo: ao mesmo tempo em que as companhias precisam miseravelmente dos malucos, elas os odeiam. Quer dizer, as pessoas que lá trabalham. O ambiente corporativo para esse tipo de gente é bastante hostil. Não raro, as empresas trazem essas pessoas para dentro e, das duas uma: ou as colocam dentro da caixa ou as relegam a uma garagem de whatever. E tá na moda, viu? Agora toda empresa quer ter uma garagem para chamar de sua.

A verdade é que a diversidade do século XXI é muito mais do que ampliar o espectro de contratação de forma a valorizar cores, gêneros e pesos diversos. A diversidade do futuro está no pensamento. Em se cercar de pessoas que pensam diferente, que fazem as coisas de forma diferente, que questionam e põem em xeque o que vem sendo feito até então. E sabendo lidar com isso, as outras diversidades, as visíveis, as óbvias, as expressas por estatísticas são consequência.

Aí pergunto: como é a sua empresa ao lidar com o pensamento diferente? Ela realmente encara a diferença como valor e estratégia, ou o ambiente para o diverso, para o pensar fora da caixa é hostil? Porque se for, a sua empresa até pode se achar o suprassumo por contratar um "profissional de diversidade" para facilitar a entrada de gente com cabelo black power no ambiente corporativo, mas a verdade é que ela corre o risco de pagar um preço alto lá na frente.




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